Afronta financeiro? Cenas em Vale Tudo abrem debate sobre manipulação econômica
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A relação entre Odete Roitman e sua mana Celina na romance Vale Tudo abriu um debate nas redes sociais sobre a valor da gestão do próprio verba e se o caso poderia ser considerado um tipo de prática abusiva de manipulação econômica. Nas cenas da trama, a vilã faz questão de ressaltar que a mana não sabe reger a própria riqueza e que, justamente por isso, estaria falindo. Mas o comportamento pode ser considerado um tipo de violência patrimonial? Quais os riscos (e impactos) de terceirizar essa gestão?
Na romance, Odete administra a riqueza da mana alegando que Celina tem hábitos consumistas — porquê trocar todos os móveis da moradia todos os anos — e que seu patrimônio estaria acabando por culpa dessa má governo dos recursos. Essa justificativa é usada porquê uma espécie de chantagem para manter Odete adiante de tudo.
No TikTok, diversos cortes de cenas da romance viralizaram e internautas opinam se concordam ou discordam da atitude da “vilã” da trama, que comumente aparece dando sermões nos tipos de gastos da mana. Em um dos comentários na rede, uma usuária disse que “a humilhação começa quando a pessoa depende financeiramente da outra” e que “isso vale para quaisquer tipos de relacionamentos”.
Essa ‘doidice’ sobre as finanças ocorre quando uma pessoa é, gradualmente ou de forma direta, afastada da gestão e das decisões sobre seu próprio patrimônio. Isso pode ocorrer por meio de manipulação emocional, silenciamento, preterição de informações ou controle excessivo, mesmo quando encapotado de “proteção”.
No caso da romance, a personagem Celina tem recursos, mas não tem autonomia, destaca Wanessa Guimarães, planejadora financeira pela Planejar. “Odete decide, opina, acusa e ameaço. Há uma substituição da voz da pessoa em relação ao próprio patrimônio. Esse é o cerne da doidice: a ruptura do vínculo entre o sujeito e sua capacidade de gerir o que é seu, com base na teoria de que “alguém sabe mais”, ou “cuida melhor””, diz a planejadora.
Aliás, segundo os especialistas ouvidos pelo Valor Investe, o trajo de uma pessoa ser consumista não justifica a perda totalidade da autonomia sobre seus bens. Esse tipo de exposição pode, inclusive, piorar a situação e substanciar o ciclo vicioso.
“Ao estigmatizar a mana, provoca ainda mais instabilidade e desvalorização. Isso pode gerar sentimentos de culpa, vergonha e impaciência, que são gatilhos conhecidos para o consumo compulsivo. Ou seja, ao invés de ajudar, a sátira contínua pode exacerbar o comportamento que ela supostamente quer emendar. O efeito é perverso: o problema financeiro não melhora, e a autoestima da vítima”, diz Samir Choaib, jurisconsulto e sócio do Choaib, Paiva e Justo Advogados Associados.
No caso da romance, a personagem Odete frequentemente reforça a teoria de que Celina é descontrolada, irresponsável e incapaz de manter sua riqueza. “Esse tipo de exposição, mormente vindo de alguém próximo e em posição de poder, não educa, desestabiliza”, diz Guimarães.
A planejadora detalha que a psicologia econômica explica esse fenômeno porquê “profecia autorrealizável”: quando uma pessoa é sempre rotulada porquê inadequada em determinada dimensão, ela pode internalizar essa imagem, perdendo a crédito para agir de forma dissemelhante. No campo financeiro, isso pode se trasladar em comportamentos porquê:
- Evitar mourejar com números, por susto de errar mais uma vez;
- Tomar decisões impulsivas, porquê forma de sossegar a impaciência;
- Desistir de aprender ou se organizar, por crer que não adianta tentar;
- Buscar conforto no consumo, alimentando ainda mais o comportamento compulsivo.
Para a planejadora, o vista mais preocupante dessa dinâmica é sua naturalização progressiva. Com o tempo, a pessoa afetada deixa de perceber a própria perda de liberdade, internalizando a teoria de incapacidade financeira. Ao mesmo tempo, a submissão econômica cria uma barreira concreta para o rompimento dessa relação abusiva, estabelecendo um ciclo perverso que reforça ainda mais o controle e o isolamento.
“A cena da romance Vale Tudo entre as irmãs Odete e Celina oferece um exemplo preciso dessa violência patrimonial em ação. Odete confronta Celina com extratos bancários, acusando-a de estar “falindo” devido ao padrão de consumo e ameaçando-a com interdição. Sob o pretexto de “proteção”, Odete exerce um controle que transcende a simples sátira financeira”, explica.
“Ao monitorar gastos, julgar comportamentos e impor condições para que Celina tenha entrada ao próprio patrimônio, Odete constrói uma narrativa que deslegitima completamente a capacidade financeira da mana. Frases porquê “não tem liquidez” e “não sabe cuidar do que tem” não são unicamente observações, mas ferramentas de controle que retiram de Celina qualquer legitimidade para tomar decisões autônomas”, enfatiza a planejadora financeira.
Quais os riscos de ‘delegar’ a gestão do patrimônio?
Esse padrão de comportamento, frequentemente legitimado por laços familiares ou pelo argumento da proteção, estabelece um envolvente de vigilância jacente, chantagem emocional e submissão prolongada e gera consequências que ultrapassam a esfera financeira, comprometendo a autoestima e a segurança pessoal da vítima.
“A pessoa afetada passa a duvidar da própria capacidade, evita confrontos para não ser punida e gradualmente internaliza a narrativa de incompetência financeira. Esse ciclo emocional e patrimonial enfraquece a autonomia individual e perpetua a submissão, criando um terreno fértil para a ininterrupção do desfeita”, diz Guimarães.
Aliás, Choaib comenta que não ter o controle sobre o próprio verba é transfixar mão de um pedaço fundamental da autonomia. “A pessoa perde a capacidade de tomar decisões sobre sua vida, fica vulnerável a abusos e pode se ver presa a uma submissão financeira que limita, inclusive, sua liberdade emocional”.
“Isso vale para qualquer pessoa, independentemente do patrimônio. E quando há muito verba envolvido, os riscos aumentam: manipulações, chantagens e até fraudes tornam-se mais frequentes”, enfatiza o jurisconsulto.
Aliás, Guimarães explica que esse controle “terceirizado” pode gerar impactos porquê:
- Subordinação nas decisões de terceiros: Quando alguém não acompanha sua movimentação financeira, acaba confiando integralmente em outra pessoa para decisões fundamentais, o que pode gerar desequilíbrios de poder em relações familiares, afetivas ou profissionais;
- Vulnerabilidade a abusos e fraudes: Delegar sem supervisão ou sem entender o mínimo sobre orçamento, investimentos e dívidas pode facilitar práticas porquê apropriação indevida ou uso não autorizado dos recursos;
- Comprometimento do planejamento de longo prazo: Sem controle, torna-se difícil estabelecer metas, edificar uma suplente de emergência, investir com consistência ou se preparar para a aposentadoria. “As decisões passam a ser tomadas de forma reativa, e não estratégica”, diz a planejadora;
- Desorganização financeira crônica: A pouquidade de nitidez pode levar a atrasos em pagamentos, acúmulo de dívidas, incidência de multas e perda de crédito, mesmo em cenários de boa renda;
- Impactos psicológicos relevantes, tendo em vista que a incerteza sobre o próprio verba costuma gerar impaciência, culpa e sensação de incapacidade, dificultando a retomada do controle e da crédito pessoal.
Entenda porquê funcionam os comportamentos abusivos
Segundo Choaib, em muitos casos, esse tipo de coerção pode configurar delito — mormente quando envolve violência patrimonial, desfeita de vulnerabilidade, constrangimento proibido, estelionato ou até apropriação indébita.
No contexto do Recta Penal brasílico, se alguém se apropria de bens ou valores alheios, mesmo com a posse legítima, mas em favor próprio e contra a vontade do titular, pode responder criminalmente. Aliás, quando há filtração, manipulação ou ameaço para que a pessoa abra mão de seu patrimônio, o responsável pode ser responsabilizado por outros crimes, porquê constrangimento proibido (art. 146 do Código Penal) ou até roubo (em situações mais graves).
Em relações familiares, esses abusos nem sempre são denunciados, diz Choaib, justamente por estarem disfarçados de “proteção” ou “desvelo”. “Mas o trajo de ocorrer dentro de moradia ou entre irmãos não torna a prática menos grave; ao contrário, o ordenamento jurídico tem evoluído para reconhecer e punir esse tipo de violência, inclusive dentro da Lei Maria da Penha, quando afeta mulheres”, explica o jurisconsulto.
Esse tipo de conduta pode ocorrer em curatelas indevidas, em relações conjugais, entre pais e filhos, entre irmãos, entre sócios ou em qualquer vínculo onde haja desequilíbrio de poder. Ou seja: qualquer laço pode homiziar esse tipo de violência, o que desmistifica o estigma de que a doidice patrimonial ocorre unicamente entre casais ou em relações com idosos.
“O que caracteriza a violência não é o tipo de parentesco, mas a quebra da autonomia da pessoa, geralmente mascarada por um exposição de “ajuda” ou “desvelo””, diz o jurisconsulto.
Esse tipo de dinâmica pode surgir em diferentes contextos: quando alguém se apresenta porquê mais pronto para mourejar com finanças, quando usa argumentos porquê “você não tem pensamento” ou “vou cuidar disso pra você”, ou quando assume o papel de gestor dos bens do outro sem transparência ou consentimento real, explica a planejadora.
De conformidade com os especialistas, esse tipo de violência pode ocorrer de diversas formas, porquê:
- Curatela indevida, quando se tenta obstar alguém que não perdeu sua capacidade de gerir a própria vida;
- Apropriação indébita, quando alguém, mesmo sem autorização formal, passa a usar bens ou recursos de outra pessoa em favor próprio;
- Violência patrimonial, que é mais ampla, e inclui desde o bloqueio de cartões e senhas até o impedimento de tomar decisões sobre propriedades, contratos, heranças ou investimentos;
- Controle sutil por preterição de informações: Mesmo sem medidas legais, a doidice também acontece quando a pessoa é excluída das conversas sobre seu verba, tem seus dados ocultados ou recebe informações distorcidas. “Isso a impede de tomar decisões conscientes e gera submissão”, diz Guimarães;
- Também pode possuir desfeita de procuração, em que uma autorização é usada para dilapidar o patrimônio da pessoa representada.
Por isso, Samir ressalta que o que pode (e deve) possuir é séquito, instrução financeira e, se necessário, acordos de gestão compartilhada, mas sempre com transparência, consentimento e saudação à vontade da pessoa. “Quando a suposta “ajuda” vira um instrumento de chantagem, o que vemos não é proteção — é controle. E isso pode ser tão nocivo quanto o consumo descontrolado“, diz ele.
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