Crédito, capital e congruência: o que o STF nos lembra sobre segurança financeira
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_f035dd6fd91c438fa04ab718d608bbaa/internal_photos/bs/2023/s/S/663bKoSVAUCAc8kUIJkQ/claudiodemoraes-colunista.jpg?ssl=1)
As operações de crédito são o motor da economia, pois viabilizam a expansão de empresas, a realização de projetos de vida por famílias e a realização de políticas públicas por governos. Ao conceder crédito, os bancos assumem compromissos com riscos compartilhados: esperam o retorno dos recursos acrescidos de juros, enquanto os tomadores os empregam para produzir, consumir ou investir.
Essa engrenagem, embora vital ao incremento econômico, também acentua os ciclos de expansão e retração. Em fases de otimismo, o crédito se expande rapidamente; em momentos de incerteza, retrai-se, travando investimentos e consumo. Para suavizar essas oscilações, a regulação bancária evoluiu de um foco microprudencial, voltado à saúde de cada instituição, para uma abordagem macroprudencial, centrada na segurança do sistema uma vez que um todo. Um dos instrumentos centrais dessa estratégia de regulação e supervisão, com vistas a prometer a segurança financeira, é o capital regulatório exigido aos bancos.
O capital regulatório, mais sabido no Brasil uma vez que índice de Basiléia, corresponde ao índice de adequação de capital (Capital Adequacy Ratio – CAR), que relaciona o capital bancário de qualidade (Tier 1 e Tier 2) aos ativos bancários ponderados pelo risco (Risk-Weighted Assets – RWA).
As operações de crédito, uma vez que ativos bancários, possuem uma ponderação de risco que entra na equação da exigência de capital, ou seja, trata-se de uma razão entre o capital bancário e o ativo ponderado pelo risco. Assim, quanto maior o risco assumido pelo banco, maior será a exigência de capital para sorver eventuais perdas, de forma que a razão capital/RWA se mantenha equilibrada e em conformidade com os requisitos regulatórios.
Portanto, a definição dos ativos financeiros e de seus riscos é fundamental. Uma vez que o risco de crédito é provavelmente o mais proeminente, oferecido o potencial de perda totalidade em caso de não pagamento, sua correta classificação tem implicações amplas na gestão da segurança financeira. Finalmente, é essa definição que orienta a quantidade de capital que o sistema bancário precisa manter.
Mas, por fim, o que e quem define uma operação de crédito?
Recentemente, o Supremo Tribunal Federalista (STF) analisou a natureza das polêmicas operações conhecidas uma vez que “risco sacado”, uma vez que forfait e confirming, e decidiu que elas não configuram operações de crédito em sentido estrito. Com base na Solução CMN 4.858/2020, o STF entendeu que tais operações consistem em antecipações comerciais de recebíveis e não em empréstimos com obrigação direta perante a instituição financeira. Trata-se, portanto, de um risco mercantil e não bancário.
Essa decisão tem implicações importantes. Ao excluir o risco sacado da base de operação do RWA, evita-se que estruturas comerciais sejam tratadas uma vez que crédito tradicional, o que poderia onerar indevidamente o capital dos bancos. Preserva-se, assim, a congruência entre a definição lícito de crédito e os parâmetros prudenciais que sustentam a segurança financeira, sem sufocar a oferta de crédito na economia.
No entanto, esse estabilidade é frágil. O julgamento do STF resgata um dilema meão para reguladores e economistas: uma vez que exigir mais capital dos bancos sem frear o crédito à economia real? Quanto maior o colchão de capital, mais resiliente tende a ser o sistema, mas cresce também o risco de retração do crédito. A literatura de segurança financeira é clara sobre esse dilema.
Foi justamente para mensurar esse dilema que Bastos, Moraes e Gargalhone (2025) desenvolveram o Índice de Eficiência Regulatória, fundamentado na técnica de Estudo Envoltória de Dados.
O índice mede a capacidade dos países de transformar capital regulatório, inputs uma vez que CAR e leverage ratio, em atividade de crédito, outputs uma vez que crédito/PIB e dispêndio do crédito. Os países mais eficientes são justamente aqueles que conseguem maximizar o crédito sem comprometer a solidez bancária, encarando segurança e desenvolvimento uma vez que aliados e não uma vez que adversários.
Essa é a encruzilhada: fortalecer o sistema financeiro sem sufocar a economia real. Uma vez que mostra o estudo, é provável conciliar ambas as metas, desde que se tenha perspicuidade técnica, rigor jurídico e perceptibilidade regulatória.
Ao delimitar juridicamente o que configura uma operação de crédito, o STF sinaliza incentivos importantes. Ao excluir certas exposições do perímetro regulatório, uma vez que o risco sacado, reconhece que o risco de crédito está presente, mas sob uma ótica mercantil. Assim, entende-se que não há urgência de alocação de capital regulatório.
Por termo, coloca-se a questão de uma vez que enfrentar os incentivos adversos decorrentes do capital regulatório. Em termos práticos, observa-se que o mercado financeiro, ao identificar que a ampliação da exposição a ativos de maior risco implica maior exigência de capital, tende a buscar mecanismos de arbitragem regulatória com o objetivo de evadir do perímetro prudencial.
No caso brasílio, esse fenômeno é particularmente visível na alocação de um volume significativo de crédito em fundos de investimento, estruturas que, por sua natureza, não estão sujeitas a requerimentos de capital. Esse constitui um dos principais desafios para os reguladores em nível global e de forma ainda mais premente para o Brasil.
** Professor e Pesquisador do Coppead, profissional em Banking, com artigos publicados em diversos periódicos internacionais. Atua no Banco Meão do Brasil na extensão de segurança financeira. Atualmente é fellow research na Universidade de Vaasa, na Finlândia. **
* A opinião do responsável e não representa necessariamente a do Banco Meão do Brasil
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_f035dd6fd91c438fa04ab718d608bbaa/internal_photos/bs/2023/s/S/663bKoSVAUCAc8kUIJkQ/claudiodemoraes-colunista.jpg)
Publicar comentário