Congresso precisa saber qual mudança do IR priorizar
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O governo mandou uma proposta de reforma do Imposto de Renda para o Congresso e o risco que se corre é que o Legislativo jogue fora o bebê e nos deixe com a chuva do banho.
Todos sabem que o Brasil tributa muito o consumo e pouco a renda. E também que a tributação da renda é pouco progressiva por cá. Dessa forma, o sistema tributário acaba por aumentar, em vez de amenizar, a má distribuição de renda do país, uma das piores do mundo.
Depois de um pregão conturbado no ano pretérito, o governo apresentou os detalhes de uma proposta que procura hostilizar o segundo problema citado. E faz isso com uma medida dividida em duas partes.
A primeira é a isenção de quem ganha até R$ 5 milénio por mês e a redução da tributação para quem recebe até R$ 7 milénio. A segunda é a tributação por um IR mínimo progressivo para quem ganha mais de R$ 50 milénio por mês, que chega a 10% para aqueles com renda mensal supra de R$ 100 milénio.
A proposta muito recebida no Congresso foi a primeira, enquanto a segunda causou questionamentos. Entre as duas, porém, é a última que ataca mais problemas.
Não que a isenção de IR para quem ganha até R$ 5 milénio não seja defensivo, diante do efeito da inflação não integralmente repassada para as tabelas. Mas talvez ela não seja tão urgente e necessária, oferecido o dispêndio fiscal importante para um país que já tem dificuldade para lastrar as contas públicas, e ao se considerar que os beneficiados não estão entre os mais pobres.
Já a correção da subtributação dos mais ricos traz justiça tributária, reduz desigualdade e ainda melhora o fiscal.
Antes de seguir, vale sobresair que essa é uma tarifa que deveria transcender a polarização política, já que medidas semelhantes foram defendias pelo governo de Jair Bolsonaro.
Apesar de não terem levado adiante a promessa de isenção de IR até R$ 5 milénio, Bolsonaro e Paulo Guedes chegaram a validar na Câmara um projeto para tributar dividendos de forma ampla, mas que também mirava os mais ricos. A contrapartida seria uma redução da alíquota das pessoas jurídicas, de forma que a trouxa totalidade sobre o lucro empresarial não superasse a atual que, em tese, é de 34%.
A proposta do governo atual é mais complexa — talvez demais —, mas tem objetivo semelhante. E o ilustração parece feito para se antecipar a prováveis objeções.
A primeira propriedade da medida é que, se aprovada, atingirá unicamente os dividendos dos mais ricos, e não dos pequenos investidores que compraram ações na bolsa de valores, o que era um ponto de soído na proposta anterior.
Em teoria, afetará os dividendos de quem recebe supra mais de R$ 600 milénio por ano. Mas, na prática, seja pela “escadinha” de IR mínimo que incidirá sobre quem está supra desse patamar, seja porque essas pessoas já pagam tributos sobre outras rendas, um estudo do pesquisador Sérgio Gobetti, do Ipea, mostra que só terão que remunerar o IR suplementar quem ganha mais de R$ 1,2 milhão. (veja a íntegra do estudo)
São muro de 154 milénio brasileiros, que estão entre os 0,4% mais ricos da população e que vinham pagando alíquotas efetivas de IR menores quanto maior a renda (ver gráfico).
Diferentemente do que constava na proposta do governo anterior, não há no projeto de lei atual uma redução do IR e CSLL sobre o lucro da pessoa jurídica (e cá estamos falando das grandes empresas, oferecido que no lucro presumido e no Simples a tributação já é reduzida) para indemnizar a novidade trouxa que incidirá sobre os dividendos.
De novo, na teoria, a trouxa sobre o lucro das grandes empresas é de 34%, o que é muito cimo na conferência internacional, o que se explica opção do Brasil de tributar o lucro numa única período (na PJ), enquanto a prática internacional é de dividir essa conta entre a empresa e o dividendo da pessoa física. Na prática, porém, por pretexto de uma série de benefícios fiscais, a alíquota efetiva sobre o lucro das grandes empresas no Brasil fica entre 22% e 25%, o que não é distante de outros países.
Para evitar que a trouxa totalidade supere os 34%, o projeto prevê que, se um sócio de empresa, ao computar o IR pago na pessoa jurídica mais o dividendo tributado, completar sujeito a uma trouxa totalidade supra dos 34%, ele terá restituição da diferença.
Sabendo que os mais ricos podem mudar de estância para tentar evitar a tributação, o governo incluiu na proposta a retenção de 10% de IR sobre o dividendo dos estrangeiros. Portanto, para evadir, não basta o sócio da empresa se mudar de país, mas a própria empresa teria que ter sua sede alterada.
De qualquer forma, os 10% de IR mínimo para os mais ricos não parecem um excesso. É a mesma mordida que incide sobre quem recebe unicamente R$ 11 milénio por mês (percentil 82 no gráfico), conforme as contas de Gobetti, e menos do que os 13% que pagam os que ganham R$ 23 milénio (percentil 94%).
Fernando Torres é editor-executivo do Valor
E-mail: fernando.torres@valor.com.br
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