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A insustentável leveza dos mercados

A insustentável leveza dos mercados

A insustentável leveza dos mercados

A insustentável leveza dos mercados

Faz alguns poucos dias que Jamie Dimon, CEO do banco JPMorgan Chase, alertou: “Estou dizendo a vocês que isso (ruptura no mercado de títulos americanos) vai suceder e vocês vão entrar em pânico. Eu não vou entrar, vamos permanecer muito. Provavelmente vamos lucrar mais verba.” Mais evidente, impossível!

Nesse mesmo diapasão — longe de querer me confrontar — venho, já há mais de um ano, comentando que esse oba-oba que vem ocorrendo na economia e nos mercados americanos é insustentável no longo prazo, e que as luzes amarelas precisam estar acesas.

Vamos aos fatos: bolsas em subida acentuada desde 2022 (com correções pontuais), no rastro das Big Techs e das empresas de IA; curva de juros invertida, sugerindo uma eventual recessão; FED com posição dúbia em relação à política monetária; indiferença quanto ao endividamento caminhando a 130% do PIB e aos déficits elevadíssimos, indo para 8% do PIB. Sem narrar que, na seara internacional, as guerras e tensões geopolíticas se acumulam. São pontos que, a meu pensamento, vêm sendo negligenciados pelos mercados.

Esses tópicos elencados compõem um cenário que extremo a irracionalidade. O mercado parece ter optado por crer numa narrativa de propagação ad eternum, descolada dos fundamentos econômicos e políticos. Parece que o Elon Musk já desconfia, pois nos últimos dias vem criticando duramente seu ex-chefe.

Há um visível descompasso entre os valuations exagerados das empresas, sobretudo as de tecnologia, e a veras de uma economia que ainda lida com os efeitos de uma inflação persistente, um ciclo de juros indefinido pelo FED e um déficit fiscal estrutural crescente. Para piorar, há a elevação das tarifas comerciais proposta pelo governo Trump, o que pode dificultar ainda mais o quadro, pois chacoalha a globalização e tende a ser inflacionário.

A sensação que tenho é a de que os mercados caminham sobre uma corda bamba, com o otimismo manteúdo mais por excessiva liquidez (ainda resquício do “jogar verba de helicóptero” na pandemia pelos bancos centrais) do que por expectativas promissoras. E o alerta do CEO do JPMorgan, posto que possa toar oportunista, não deixa de ser um chamado à razão: em qualquer momento, haverá um potente ajuste. O mercado de títulos públicos (já não mais AAA pelas agências de rating), que é o pilar da segurança financeira americana, emite sinais de saturação. A inversão da curva de juros até pouco tempo é exclusivamente um sintoma; a doença é mais grave.

Meu receio é que, quando esse realinhamento vier, seja escarpado. E, uma vez que sempre acontece em ciclos de “êxtase”, os que hoje parecem “geniais” por apostarem na subida cega podem se tornar os mesmos que, amanhã, venderão no desespero. Assim, não se trata de prever catástrofe, mas de manter o tino crítico em meio ao “euforismo” (euforia com otimismo).

Por cá, a situação não é muito dissemelhante. Temos um crônico problema fiscal, que não se resolve, e o governo atual não endereça a solução; exclusivamente tenta tergiversar e puxar para 2027.

Ao que parece, a equipe de Haddad e Tebet sempre apela para mais impostos, mas reforma que é bom… zero. Mudou-se a regra fiscal e, de tempos em tempos, sugerem-se paliativos, uma vez que agora, ao indicar o uso do IOF sobre produtos despropositados, uma vez que VGBL e risco sacado (que, provavelmente, será sacado — com trocadilho). Especulam-se taxação sobre bets e criptos, além da antecipação de receitas de petróleo. E vamos em frente!

Alguns poucos argumentam que “tá tudo muito”, finalmente o Ibovespa está subindo e o real se valoriza neste ano. Em minha forma de indagar, no entanto, tais comportamentos têm mais a ver com o cenário de realocação dos investimentos globais do que com méritos nossos, tanto é que a Moody’s rebaixou recentemente a perspectiva do país. E, aos 61 anos, não acredito em Papai Noel!

Diante desse cenário, o mais sensato é adotar uma postura de prudência. O melhor é agir uma vez que aquele cachorro que, por ter sido mordido por serpente, se esconde ao ver as linguiças. O momento exige menos exaltação e mais lucidez diante dos riscos que se acumulam, tanto lá fora quanto cá. Ignorar os sinais evidentes de excesso na alavancagem global, da deterioração das contas públicas, da complacência com a inflação e da desconexão entre preços de ativos e fundamentos é uma vez que galhofar de cabra-cega na borda do precipício.

O alerta está oferecido e cabe aos agentes econômicos, investidores e formuladores de políticas se prepararem para o que pode deixar de ser exclusivamente uma hipótese e se tornar, mais cedo ou mais tarde, uma inevitável imposição da veras.

Disclaimer: Nestes tempos estranhos em que vivemos no nosso país, onde o uso de figuras de linguagem e piadas é passível de punições, gostaria de enfatizar que a frase supra, que avalancha ao cachorro, é uma metáfora com intuito de conferência, sem querer ofender pets de estimação.

Alexandre Espirito Santo, Sócio e Economista-Superintendente da Way Investimentos, professor de Economia e Finanças da ESPM.

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Alexandre Espirito Santo — Foto: Valor Investe

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