A persuasão com método tem nome
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Semana passada, fui ao Rio de Janeiro, dar uma palestra e aproveitei a minha ida para fazer uma agenda por lá. Fazia bastante tempo que não ia ao Rio a trabalho. Na verdade, fazia um tempo que não precisava viajar a trabalho. Mas não é da viagem nem do Rio que quero falar hoje por cá. Quero falar sobre persuasão. E ela acompanhada de método tem nome: marketing.
Mal o avião pousou, recebi uma mensagem no meu WhatsApp da cia aérea em que viajava. Foi só desligar o modo avião que a notificação apareceu: Ela dizia: “Olá! Te desejamos boas-vindas ao Rio de Janeiro! Informamos que você receberá um bônus de até R$ 300, que poderá ser usado em diversas lojas e restaurantes para aproveitar ao sumo sua visitante ao Rio. Clique em uma das opções aquém para deslindar.” As opções: “Ativar ou Não tenho interesse”. A mensagem ainda me alertava: “Por obséquio, confirme para ativar dentro dos próximos 30 minutos.”
A princípio achei que se tratava de uma fraude, mas a mensagem veio de maneira tão sincronizada com a cronologia das coisas que resolvi aventurar. Mal cliquei, me foi apresentado um cardápio de ofertas que variavam entre alugar um sege na capital carioca com 30% de desconto, até a adesão a um clube de compras. Mas a oferta tinha um pormenor importante: eu deveria escolher uma das opções nos três minutos seguintes, se não, não teria mais recta à benesse. Apesar de pressionada pelo relógio, nenhuma daquelas ofertas me interessou. Elas não faziam sentido para mim, mas me despertou a curiosidade em saber à quantas pessoas elas poderiam fazer e o quão efetiva aquela astuta abordagem de marketing seria.
Vale um adendo: eu sou graduada em Informação Social, mais especificamente, em publicidade e propaganda e pós-graduada em marketing de serviços. Portanto, sei do poder que o marketing tem e dele sou fã.
A abordagem pelo WhatsApp, além de criativa, é um exemplo clássico de marketing tempestivo, aquele que acontece no momento exato em que o consumidor está mais suscetível a tomar decisões por impulso. A força da abordagem quando usada de maneira criativa, oportuna e estratégica pode comprometer a vida financeira de muita gente quando são pegas com a guarda baixa. É nessa hora que uma enxurrada de vieses toma controle da situação.
O tempo exposto — três minutos para a escolhe — é o velho espargido viés da escassez em ação. Quando um tanto é oferecido com tempo restringido, nosso cérebro interpreta uma vez que uma oportunidade única que não pode ser desperdiçada. É o mesmo gatilho mental usado em liquidações-relâmpago, passagens “só até meia-noite” ou em notificações do tipo “mais quatro pessoas estão vendo essa oferta agora”. A urgência desliga nosso modo analítico e liga o modo emocional.
Outro viés poderoso ativado nesse tipo de ação é o FOMO —fear of missing out, ou temor de estar perdendo alguma coisa ou permanecer de fora da boa da vez. Mesmo que nenhuma das opções fizesse sentido para mim, ainda assim gastei minutos preciosos tentando entender se, por contingência, não havia um tanto que pudesse valer a pena. No fundo, a verdade é que não queremos perder o bônus, mesmo que ele seja irrelevante e nem mesmo faça sentido. A decisão se baseia em oportunidade e não premência. E cá mora o risco, pois não é sobre o que você precisa, e sim o que você pode estar deixando passar.
O marketing bem-feito (e cá faço questão de dar o préstimo técnico) entende o comportamento humano muito antes que o próprio consumidor entenda. Ele não tenta convencer com argumentos racionais, mas sim com timing, emoção e uma pequena ração de pressão. Uma vez que profissional da dimensão, é impossível não apreciar a sofisticação da estratégia, mas, uma vez que educadora financeira, inevitável não tanger o alerta.
O marketing, quando muito muito executado, é persuasão com método. Saber disso já é meio caminho percorrido para se blindar da abordagem tempestiva que pode nos pegar no contrapé. Vale vincular o radar, acionar o autocontrole para não deixarmos a conta bancária à mercê do impulso. Assim, é provável usar esses mesmos três minutos para respirar fundo, ajustar o processo decisório e clicar no “não tenho interesse” antes que seja tarde demais.
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