A taxa de câmbio está refletindo todos os fundamentos?
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Na dez de 1990, o nosso principal índice de ações, o Ibovespa, apresentava uma propriedade marcante: excessiva concentração. Só para se ter uma teoria, mais de 40% da constituição do índice estava numa única ação: a Telebras, empresa brasileira de telecomunicações, posteriormente privatizada durante o governo FHC.
Semana passada, perguntei ao ChatGPT por que deveríamos comprar S&P500 agora, já que “todo mundo” está mandando “se abraçar”, pois o firmamento é o limite, com alvos variando entre 6.800 e 7.000 pontos — supra dos quase 6.500, mesmo depois de uma subida de 30% em exclusivamente 5 meses.
A primeira, entre meia dúzia de razões elencadas, foi: porquê forma de diversificação. Variar? Hoje, tapume de 10% das empresas americanas (com destaque para duas ou três) concentram mais de 75% do valor da bolsa de lá. Isso é variar? Porquê dizia o saudoso Bussunda: “fala sério”!
É lógico que se você colocar parcelas da sua carteira em diversos ativos a diversificação ocorre. Porém, usar um índice enormemente concentrado com esse objetivo, negociando a P/L 23x não me parece uma boa decisão.
Na verdade, um tanto que tem me incomodado bastante é que os livros tradicionais de Finanças e Economia, aqueles consagrados por décadas, estão com dificuldades de explicar o comportamento recente dos mercados. O que estamos vivenciando parece estar nas exceções dos bons manuais e teorias. Querem outro exemplo?
Dentre essas “esquisitices”, a que mais me incomoda é o comportamento do dólar por cá. A moeda americana foi cotada, na última quarta-feira, a R$ 5,38, inferior do que considero o preço médio justo, calculado com base na taxa de câmbio real histórica (média aparada), que gira em torno de R$ 5,40. Mas não é só isso…
O balanço de pagamentos de um país, que registra suas relações econômicas com o mundo, é subdividido em dois grandes grupos: transações correntes (que envolvem o transacção de bens e serviços) e conta de capitais (investimentos diretos e de carteira/especulativos). Pela teoria, o balanço está em estabilidade quando seu saldo é nulo.
Tradicionalmente, o Brasil apresenta déficits em transações correntes, compensados pela ingressão de capitais, sobretudo de investimentos produtivos (porquê fábricas de multinacionais instaladas cá).
O que me impressiona é que, neste momento, o déficit em transações correntes está saliente, em torno de 3,5% do PIB e crescente; um resultado zero confortável. Para piorar, não se pode olvidar do problema criado por Donald Trump, com suas tarifas de 50% sobre nossos produtos exportados para lá. Ou seja, o tarifaço dele é ruim sob a ótica da balança mercantil, rubrica fundamental nas transações correntes, que tende a piorar.
Assim, não vislumbro, porquê antes, um financiamento “tranquilo” e, mais do que nunca, o ajuste precisaria recair sobre o preço — a taxa de câmbio — que deveria se desvalorizar. O problema é que, ao invés disso, ela está se valorizando, acompanhando o DXY (índice do dólar frente a uma cesta de moedas), que derrete mais de 10% desde janeiro.
A questão é que, em países porquê o nosso, pela boa teoria, a taxa de câmbio não reflete exclusivamente o desempenho extrínseco da moeda americana, pois incorpora outras variáveis, notadamente o risco-país. Explicando melhor…
O que quero expressar é que se houver estresses relacionados à política, por exemplo, à lei Magnitsky (que vem assombrando autoridades locais) — ou um tanto similar, porquê interrupção a entrada de sistemas bancários e nuvens, frigoríficação de ativos etc —, os investidores estrangeiros que cá estão formarão fileira até o vale do Anhangabaú para comprarem dólares e “vazarem”.
Sem relatar a eleição presidencial de 2026, que pode deixar os investidores inseguros, os malabarismos fiscais para deixar fora da meta orçamentos importantes, porquê a recente ajuda às empresas atingidas pelo imbróglio das tarifas, ou a teoria de gerar uma moeda de transacção selecção.
Não dá, pois, para crer que diante de um tanto muito, muito grave, que demande uma saída massiva de dólares, o investidor estrangeiro vá titubear e pensar: “ah, o dólar está fraco lá fora, logo deixa pra lá, que cá tem praia e carnaval; vamos continuar comprando reais e tudo vai permanecer muito no final”. Nenhuma daquelas hipóteses, em minha visão, está embutida neste preço de R$ 5,38 e, no entanto, o que mais ouço por aí é que a taxa vai tombar para R$ 5,00-20 até o término do ano porque a tendência da moeda lá fora é de queda e o fluxo de ingressão “tá bombando” para aproveitar o diferencial de juros.
Finalizo com a constatação de que somos o país das jabuticabas e dos “jeitinhos”. Todavia, de notório, é que temos duas hipóteses para equalizar o problema do balanço de pagamentos: ou se faz uso das reservas internacionais ou se desvaloriza a moeda, para melhorar os termos de troca com o restante do mundo, pois uma terceira, a taxa de juros para trazer mais dólares, já está muito elevada. Quanto às variáveis associadas aos riscos políticos supracitados, se se efetivarem, o mais provável seria uma pressão altista poucas vezes observada sobre a taxa, mesmo com o DXY em queda.
Alexandre Espirito Santo, Sócio e Economista-Gerente da Way Investimentos e professor de Economia e Finanças do IBMEC-RJ e ESPM
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