Fazer política econômica é elaborar regras simples!
Um dos principais objetivos da política econômica é proporcionar segurança macroeconômica. Sem essa segurança, mesmo os estímulos fiscais e monetários direcionados a questões legítimas tendem a fracassar, gerando frustração. Por isso, as recomendações mais eficazes para a gestão da economia enfatizam a premência de um sistema de regras monetárias e fiscais que seja simples de impor e fácil de compreender.
O debate entre regras e discricionariedade na política econômica está profundamente enraizado na literatura econômica e tem implicações diretas para a segurança e o desenvolvimento de longo prazo. A teoria econômica destaca que sistemas baseados em regras oferecem previsibilidade, disciplina e credibilidade, elementos fundamentais para a construção de uma economia saudável e resiliente.
Autores uma vez que Kydland e Prescott (1977), em sua teoria de inconsistência temporal (“Rules Rather than Discretion: The Inconsistency of Optimal Plans”), argumentam que a carência de compromissos de longo prazo leva a decisões de pequeno prazo que podem ser prejudiciais ao bem-estar econômico. No campo da política monetária, a adoção de metas de inflação, amplamente discutida por Taylor (1993) (“Discretion versus Policy Rules in Practice”), é um exemplo de uma vez que regras claras podem reduzir incertezas e alinhar expectativas dos agentes econômicos. Esses estudos consolidam a visão de que sistemas baseados em regras promovem maior previsibilidade e crédito.
A introdução do sistema de regras na política econômica foi verificada no Brasil durante os mandatos do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), entre 1995 e 2002.
A implementação do regime de metas para a inflação em 1999, inspirado na literatura sobre regras monetárias, foi um marco para a política econômica brasileira. Essa abordagem baseava-se na experiência internacional e na teoria de que metas claras reduzem a incerteza, alinham expectativas e reforçam a credibilidade do Banco Médio.
No contextura fiscal, o governo FHC introduziu a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em 2000, com o objetivo de estabelecer limites claros para gastos públicos e endividamento. Inspirada por ideias uma vez que as de Barro (1979) (“On the Determination of Public Debt”), a LRF buscava fabricar um busto institucional que limitasse a expansão descontrolada de déficits fiscais, garantindo a sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas.
No entanto, o descuramento das regras e a opção por políticas discricionárias sem ancoragem em regras sólidas foi utilizada no governo Dilma Rousseff (2011-2016).
Esse período é frequentemente citado uma vez que um exemplo dos efeitos deletérios de políticas fiscais expansionistas.
A estratégia de política fiscal conhecida uma vez que “contabilidade criativa”, que incluiu a subnotificação de gastos e o uso de receitas extraordinárias para maquiar resultados fiscais, comprometeu a credibilidade das contas públicas e levou ao rompimento do regime de metas fiscais. Essa abordagem, somada ao aumento significativo de gastos públicos discricionários, resultou em uma escalada da dívida pública, deterioração do superávit primitivo e perda de crédito nos mercados financeiros.
No livro Caminhos e Descaminhos da Estabilização, Afonso Celso Pastore analisa criticamente as políticas econômicas adotadas no período Dilma, destacando que a falta de comprometimento com metas de superávit primitivo corroeu a crédito dos agentes econômicos.
Segundo Pastore, a contabilidade criativa e o imperialismo fiscal desequilibrado minaram a credibilidade do governo, gerando um envolvente de instabilidade econômica e aumento do risco-país. Ele também argumenta que as políticas intervencionistas falharam em fabricar os estímulos esperados para o desenvolvimento, deixando um legado de fragilidade fiscal que exigiu severos ajustes nas administrações subsequentes.
Por outro lado, os sucessos observados nos governos FHC e Michel Temer (2016-2018), que aplicaram sistemas de regras fiscais e monetárias de forma consistente, devem servir de inspiração para os governos atuais e futuros. Durante o governo Temer, a introdução do teto de gastos consolidou a credibilidade fiscal e estabilizou expectativas, contribuindo para a recuperação econômica em seguida a crise herdada do governo Dilma.
Essas experiências reforçam que regras simples e claras, uma vez que o foco na produção de superávits primários, têm resultados comprovadamente positivos para a economia brasileira.
Nesse sentido, o aprofundamento do sistema de regras monetárias, com a consolidação da independência financeira do Banco Médio, e a formulação de regras fiscais claras, que assegurem o estabilidade das contas públicas e a geração de superávits primários sustentáveis, devem ser prioridades para as administrações futuras. Outrossim, em um contexto marcado pela economia da atenção, uma vez que destaquei em meu último cláusula no Valor Investe (“Econometria e a Economia da Atenção”), a simplicidade das regras econômicas se torna ainda mais crucial.
Regras excessivamente complexas, que exigem uma atenção prolongada de tomadores de decisão e agentes econômicos, podem prejudicar a implementação e a adesão a políticas eficazes. Regras claras, transparentes e facilmente comunicáveis têm maior chance de sucesso em um envolvente onde as informações são abundantes, mas o tempo e a capacidade de foco dos agentes são limitados. Assim, uma economia que valoriza a atenção e a simplicidade tende a ser mais eficiente, mormente em tempos de subida volatilidade e incertezas.
Essas medidas oferecem uma base sólida para reduzir incertezas, alinhar expectativas e promover desenvolvimento econômico sustentável no longo prazo. A história recente do Brasil demonstra que quando seguimos essas diretrizes fomos mais resilientes a choques externos e menos vulneráveis a crises de crédito.
** Professor e Pesquisador do Coppead, profissional em Banking, com artigos publicados em diversos periódicos internacionais. Atua no Banco Médio do Brasil na superfície de segurança financeira, com experiência em regulação e supervisão bancária. *
* A opinião do responsável e não representa necessariamente a do Banco Médio do Brasil
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