Mesmo com Selic paragem em 15%, empréstimos encareceram
Ontem (10), o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a Selic em 15% ao ano. Mas mesmo com a taxa básica de juros estacionada no mesmo patamar desde o termo de junho, quatro das oito principais linhas de crédito pessoal do país encareceram desde logo. Segundo especialistas, isso pode ser explicado pela expectativa dos bancos de que a inadimplência continue elevada.
O Banco Medial elevou a Selic para 15% no final de junho de 2025. De lá para cá, os juros médios praticados na risco de empréstimo para a obtenção de outros bens saiu de 40,76% ao ano para 48,84%; as taxas do crédito pessoal não consignado saíram de 74,92% para 89,26%; os juros do consignado do setor privado subiram de 44,75% para 46,78% e os juros do cartão de crédito parcelado saíram de 168,83% para 177,27%.
Portanto, metade das oito linhas analisadas pelo levantamento do Valor Investe com dados do Banco Medial mostraram um aumento nos juros praticados mesmo com a Selic estacionada em 15%.
Em contrapartida, o consignado do setor público e o consignado do INSS ficaram praticamente estáveis. O primeiro saiu de 24,31% para 24,02% e o segundo saiu de 24,31% para 24,46%.
Já as taxas do cheque privativo caíram de 144,09% ao ano para 127,50% e as de aquisições de veículos saíram de 24,75% para 23,58%.
Mas se a Selic ficou igual, por que aconteceram essas mudanças?
Segundo o professor Alexandre Chaia, pesquisador do Insper, existem diferentes fatores que contribuem para a formação da taxa cobrada pelos bancos. Há, por exemplo, o chamado spread bancário, que é a diferença entre o dispêndio que o banco tem para captar recursos e o valor que ele serpente do cliente no empréstimo. Entram nessa conta despesas com logística, salários, tributos, inadimplência e até os depósitos compulsórios que os bancos são obrigados a manter no Banco Medial.
Assim, os principais fatores que influenciam nos juros cobrados pelas instituições financeiras são:
- A própria Selic. Finalmente, quando um banco precisa captar recursos (ou seja, pegar verba emprestado para depois repassar aos clientes), ele se baseia nela;
- O lucro que o banco visa ter naquele resultado. Nesse caso, esse fator também costuma ser impactado pela Selic, já que ela influencia nos custos da instituição;
- Os custos operacionais de cada risco. Isso porque os custos de oferecer e operar um cartão de crédito são diferentes dos custos de um crédito pessoal contratado na dependência, que por sua vez também difere de um empréstimo contratado via app, por exemplo;
- Os impostos pagos pela instituição financeira para oferecer aquele serviço. Mas, segundo o professor, esse dispêndio é parecido em todas as linhas
E, por termo, o fator que mais explica o aumento de algumas linhas recentemente:
- A inadimplência esperada. Isso porque, quanto menos pessoas pagam, mais supino o banco precisa cobrar de todos para “indemnizar” essas perdas
O que explica a inadimplência maior?
De concórdia com o professor Henrique Castro, pesquisador da Escola de Economia de São Paulo da Instalação Getulio Vargas (FGV), as famílias brasileiras estão com nível de endividamento supino, o que justifica os bancos terem mantido o spread mais supino.
Para se ter uma teoria, a inadimplência das famílias brasileiras atingiu novo recorde em setembro, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), divulgada no primórdio de outubro pela Confederação Pátrio do Transacção de Bens, Serviços e Turismo (CNC). De concórdia com o levantamento, 13% das famílias afirmaram não ter condições de remunerar suas dívidas, o maior percentual desde o início da série histórica, em 2010. A inadimplência universal chegou a 30,5%, também em patamar recorde.
Por que, logo, as pessoas não estão pagando suas dívidas e, portanto, pressionando as taxas de juros dos empréstimos?
Os pesquisadores estão se debruçando nas estatísticas para entender o comportamento, que pode estar sujeito a inúmeros fatores. Mas, segundo o professor do Insper, secção da resposta pode estar no desenvolvimento das bets.
“Historicamente, o principal motivo que leva as pessoas a ficarem inadimplentes é a perda de tarefa. Dados mostram que 50% das pessoas dão calote porque perderam renda de tarefa, já 15% é porque alguém da família perdeu renda. Mas com o salário crescendo e pessoas empregadas, perguntei para muitos pesquisadores o motivo de a inadimplência estar aumentando. Cada um tem várias explicações, mas uma explicação em geral a todos é bet“, afirma o professor Chaia.
E já houve, inclusive, setor que percebeu a mudança no padrão de consumo das pessoas desde que as casas de aposta se popularizaram no país, porquê foi o caso dos supermercados, que registraram uma queda no consumo.
Aliás, no primórdio de agosto, a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) em parceria com a AGP Pesquisas, divulgou o estudo “Efeito das apostas esportivas no varejo brasílio”, que revelou que 63% dos brasileiros que apostam on-line tiveram secção de sua renda comprometida com essas atividades.
Segundo Chaia, os dados mostram que é verosímil que as famílias estejam migrando secção de sua renda para as apostas e abrindo mão de outros gastos e até mesmo do pagamento de dívidas. “O varejo pode até não sentir tanto, porque há muita compra parcelada. Mas setores em que o pagamento é à vista, porquê o de supermercados, já percebe essa queda no consumo”, diz.
O professor Castro concorda que as bets podem estar piorando a saúde financeira das famílias, principalmente porque há uma percepção equivocada do que efetivamente representa uma aposta esportiva. “Eu tendo a concordar que as bets pioram a saúde financeira das famílias e esse problema é importante porque muita gente acredita nelas não só porquê forma de diversão, mas porquê forma de investimento, o que não é“, afirma.
E a tendência daqui em diante, qual é?
Segundo analistas, a situação se torna ainda mais complexa porque a tendência, daqui em diante, não é que isso melhore muito. Primeiro, porque não tem sido feito muitos esforços para testilhar o problema social que as apostas podem gerar. Aliás, com incertezas relacionadas à economia daqui em diante, principalmente em um ano eleitoral, é verosímil que o cenário porquê um todo se deteriore, o que afeta mais ainda a inadimplência.
“Quando o Banco Medial principiar a reduzir a taxa Selic vai ter uma queda nos juros cobrados das linhas dos consignados públicos e dos créditos com garantia de bens e imóveis, todavia pode ter um aumento no dispêndio das demais linhas de empréstimos porque a expectativa para a inadimplência em 2026 está aumentando e as instituições financeiras começaram a precificar essa piora“, explica o professor Chaia.
O professor Castro destaca, ainda, que a Selic deve tombar, mas não de maneira tão intensa. “Não vamos entrar em um regime de juros baratos. O Brasil continua com juros elevados para o próximo ano, é isso que o mercado está precificando hoje. Os juros até vão tombar, mas muito lentamente. Logo, a gente pode verificar queda nas taxas de crédito, mas a gente não vai ter um cenário de águas tranquilas“, diz.
Portanto, a combinação entre inadimplência persistente, uso crescente de renda em atividades de aposta e um envolvente econômico onusto de incertezas tende a manter os bancos cautelosos e os juros elevados.
Casas de apostas rebatem a teoria
O Instituto Brasiliano de Jogo Responsável (IBJR), que representa algumas das principais casas de aposta do país, rebateu as alegações. Segundo a entidade, críticas recentes ao setor ignoram dados oficiais sobre as reais causas do endividamento no Brasil e distorcem o papel das apostas regulamentadas no país.
De concórdia com o IBJR, a inadimplência elevada tem porquê principais causas “juros elevados, baixa instrução financeira e a privação histórica de limites aos abusos do sistema de crédito”.
Leia na íntegra o expedido do IBJR:
“O Instituto Brasiliano de Jogo Responsável (IBJR), que reúne as principais empresas de apostas do Brasil e do mundo, manifesta seu repúdio às críticas direcionadas ao setor de apostas esportivas regulamentadas envolvendo empréstimos e o endividamento da população.
Dados recentes da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), da Confederação Pátrio do Transacção, mostram que quase 80% das famílias brasileiras estão endividadas, tendo o cartão de crédito — e não as apostas — porquê principal vetor desse endividamento. Trata-se de um instrumento massivamente ofertado no país, frequentemente associado a taxas de juros que ultrapassam qualquer padrão internacional. Vale realçar que cartão de crédito não é aceito pelos operadores devidamente regulamentados no Brasil.
Os lucros bilionários do sistema financeiro são públicos e transparentes. Se a inadimplência fosse, de indumento, o problema estrutural alegado, as provisões reduziriam de forma significativa esses resultados — o que claramente não ocorre. Isso porque o risco é repassado ao consumidor de forma automática, via spread bancário, há décadas, sem barreiras efetivas ou mecanismos robustos de incentivo ao crédito responsável.
Surpreendentemente, não há no país um debate sério sobre empréstimo responsável, apesar de ser ali que nasce boa secção do endividamento crônico da população. Ainda assim, tenta-se erigir uma narrativa infundada de que o setor de apostas seria protagonista nesse cenário.
A verdade é mais complexa e exige honestidade: juros elevados, baixa instrução financeira e a privação histórica de limites aos abusos do sistema de crédito são fatores determinantes para o ciclo de endividamento que atravessa gerações no Brasil.
Tampouco é admissível utilizar números de 2024 — anteriores à atual regulamentação das apostas esportivas — para sustentar críticas ao setor. Desde a regulamentação, o IBJR tem atuado pela consolidação de um envolvente rigorosamente fiscalizado, com operadores autorizados, regras claras e compromisso efetivo com a conformidade e com a proteção ao consumidor.
O IBJR reforça seu compromisso com o diálogo qualificado para o desenvolvimento de um mercado regulado, seguro e responsável, que contribua para a economia brasileira e fortaleça mecanismos de proteção ao consumidor”.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_f035dd6fd91c438fa04ab718d608bbaa/internal_photos/bs/2021/j/o/fm53RAT7S9BHhP2Hy4yg/sized-blog-2656x1077-bitcoin-d-keine-istock-by-getty-images-istock-1056226168.png?ssl=1)
Publicar comentário