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Reflexões sobre o cenário de investimentos no mercado internacional

Reflexões sobre o cenário de investimentos no mercado internacional

Reflexões sobre o cenário de investimentos no mercado internacional

Reflexões sobre o cenário de investimentos no mercado internacional
Aceleração inesperada da inflação americana poderia forçar o banco central a manter os juros elevados, ou até subir as taxas. Isso teria impactos negativos nos mercados, especialmente de ações Gostaria de começar minha jornada de artigos neste ano desejando um feliz 2025 e agradecer a todos os leitores e leitoras que me acompanharam aqui no Valor Investe ao longo de 2024.
Nesse primeiro texto, vou compartilhar como vejo o cenário de investimentos no mercado internacional, que começa o ano com diversos fatores a serem observados e, novamente, em mais um ambiente desafiador para a alocação de ativos.
Em nossas recomendações atuais, temos adotado uma postura de posicionar as carteiras a fim de se beneficiarem de um quadro mais benigno nos Estados Unidos e, paralelamente, se protegerem de riscos no mercado europeu.
Como já mencionei em artigos anteriores, é sempre necessário um olhar mais atento para a economia dos EUA, que, por sua relevância e abrangência, acaba sendo um norteador para a economia global.
Desde a eclosão da pandemia da Covid, no final de 2019, e a consequente implementação de expressivos pacotes fiscais, no final do governo Trump (2020) e depois no primeiro ano do governo Biden (2021), a economia americana tem mostrado um boom de crescimento.
O principal motor dessa performance foi a forte recuperação do consumo, posteriormente seguida pelo aumento dos investimentos. A alta da imigração também teve participação, ao fornecer mão de obra para atender à crescente demanda das empresas, bem como a melhora da produtividade, provavelmente associada ao aumento dos gastos com inteligência artificial e maior adoção de novas tecnologias. Além disso, a normalização da alta inflação vista no pós-pandemia permitiu que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) começasse um processo de corte dos juros em setembro do ano passado, após dois anos de taxas bastante elevadas.
Como resultado, a economia americana cresceu mais rápido que seus principais parceiros no mundo desenvolvido nos últimos anos e já se recuperou completamente do choque da Covid, sendo hoje mais de 11% maior do que era ao fim de 2019. Como comparação, o PIB da zona do Euro cresceu menos da metade (4,6%) no mesmo recorte, e o Japão ainda menos (2,6%). No Brasil o PIB teve um desempenho bastante satisfatório, também avançando 11% no período, ainda que o comportamento dos ativos não tenha sido o esperado. Mas essa é uma discussão para outra coluna…
Esse chamado “excepcionalismo” da economia americana tem tido impacto bastante positivo nas bolsas de valores, ao mesmo tempo em que o boom da inteligência artificial inflou o valor das ações das empresas de tecnologia.
Desde 2020, o S&P, principal índice de bolsa nos EUA, registra retorno de 97% (sendo 25% apenas em 2024) comparados com 31% na Europa e 29% no Japão – considerando retorno em dólar.
Na renda fixa os retornos são menos expressivos, porque, apesar do recuo recente, tivemos elevação dos juros no período. Ainda assim, uma carteira diversificada gerou ganhos ao redor de 37% entre 2020 e 2024.
Atualmente, temos recomendado maior exposição em ativos de crédito dos Estados Unidos sem grau de investimento, com taxas historicamentfeuae elevadas que realçam a atratividade da classe. Por outro lado, mantemos uma visão mais neutra para títulos do Tesouro e papeis com grau de investimento nos EUA, além de renda fixa de mercados emergentes. Nos mercados acionários, seguimos com visões neutras para as bolsas americana, japonesa e de mercados emergentes, enquanto defendemos uma menor exposição às bolsas europeias.
Olhando para a frente
Mas o que devemos esperar para 2025? Qual o principal risco para a continuação desse cenário positivo nos EUA?
Na minha opinião, o maior risco seria uma surpresa negativa com a inflação. Isso porque uma aceleração inesperada poderia forçar o banco central americano a manter os juros elevados, ou até subir as taxas, provocando uma desaceleração mais forte da atividade. Isso teria impactos negativos nos mercados, especialmente no mercado acionário.
Como comentado acima, a inflação já cedeu consideravelmente dos níveis vistos no período pós-pandemia. O núcleo do PCE (sigla que, traduzida do inglês, significa Índice de Preços de Gastos em Consumo), medida de inflação preferida do banco central americano, chegou a registrar elevação de 5,6% no pico recente, convergindo para 2,8% no fim do ano passado. Ainda que a inflação esteja acima do desejado (nos Estados Unidos o Fed tem uma meta implícita de 2%), é notável que a queda da inflação tenha ocorrido praticamente sem custo em termos de atividade econômica.
E de onde poderia vir essa surpresa com a inflação? Eu vejo duas possibilidades: a primeira seria a manutenção da atual dinâmica de crescimento acima do potencial por muito tempo, de forma a pressionar os custos e causar aumento de preços. Mas nesse caso, o Fed estaria a postos – como já parece estar – para interromper os cortes nos juros e desacelerar um pouco o crescimento. Assim, sobraria o risco associado às políticas de tarifas e imigração do novo governo de Donald Trump.
A retórica da campanha deixou os analistas americanos bem preocupados com a possibilidade da imposição de elevadas tarifas sobre todos os bens importados. Isso porque, no primeiro mandato, o governo Trump não cobrou tarifas de importação de bens de consumo final. O Iphone produzido na China, por exemplo, não foi taxado. As tarifas foram impostas ao longo da cadeia de produção, de forma a dissipar os impactos sobre o consumidor final. Mesmo assim, houve inflação em alguns bens finais, mas nada que tivesse causado maior comoção.
Agora, no entanto, se a ameaça for cumprida, a imposição de tarifas sobre todos os tipos de bens, vindos da China ou de outros países, poderia causar uma elevação indesejada da inflação, levando o Fed a reagir e, em último caso, até voltar a subir os juros.
No caso da imigração, o fechamento das fronteiras, junto com a adoção de políticas de deportação, poderia afetar o mercado de trabalho, pressionando os salários dos setores mais dependentes, exatamente como vimos na pandemia, antes do governo Biden permitir o aumento maciço da entrada de estrangeiros.
Isso vai acontecer? Não temos como saber.
Quem me acompanha aqui sabe que sou mais otimista e acho mais lógico que haja uma moderação na retórica da campanha de modo a evitar uma alta indesejada da inflação e uma reação do banco central americano. Mas não dá para apostar todas as fichas nisso.
A notícia boa é que não falta muito tempo para sabermos. Mais alguns dias apenas.
Nicholas McCarthy é diretor de estratégia de Investimentos do Itaú Unibanco e o e-mail é: investimentos@itau-unibanco.com.br
Nicholas McCarthy
Arte

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