Se ninguém paga, não vale zero?
E se o quantia deixasse de viver amanhã? O que sobraria do que você faz, consome, valoriza? Seria provável continuar tocando a vida normalmente ou tudo colapsaria em silêncio?
O quantia é esse denominador geral. Ele coloca valor em tudo. É o que todos querem sempre mais. O que relativiza e também o que padroniza. Há muitas definições informais sobre o que ele é e quais funções cumpre. Mas a pergunta que me vem à cabeça — e que compartilho cá — é outra: será que deveríamos dar tanta valor a ele?
Logo que comecei a investir em fintechs, fui apresentado a uma iniciativa que nunca saiu da minha cabeça. Uma empreendedora estava construindo um sistema de trocas fundamentado não em quantia, mas em tempo. A teoria era que uma hora de consultoria financeira, por exemplo, pudesse ser trocada por uma hora do trabalho de um pedreiro ou por alguém que instalasse um eletrodoméstico na sua mansão.
Confesso que, de início, achei a teoria muito esquisita. Não investi. Não sei qual foi o sorte do projeto, mas imagino que não tenha ido muito longe. E entendo o porquê. Nem todas as horas têm o mesmo valor de mercado. Coloca o mesmo preço em todas as atividades e serviços soa bonito, mas não se sustenta economicamente. Uma hora minha valeo mesmo que uma hora de qualquer outra pessoa, com habilidades totalmente distintas e em setores com níveis diferentes de escassez? 🤔 isso não parece funcionar na prática.
O caminho procedente seria gerar um “mercado de horas”. Alguma coisa porquê: 1 hora de consultoria financeira equivale a 3 horas de serviço manual, por exemplo. Mas aí já estaríamos criando uma lógica de conversão. E pronto — voltamos à teoria de quantia. Só que, dessa vez, representado por horas.
Outra estrato complexa dessa discussão está nas decisões que tomamos com base no quantia. Quantas pessoas você conhece que estão presas em trabalhos que não gostam, unicamente para prometer um salário no termo do mês? E mais: quantas de suas despesas fixas representam de vestimenta o que elas querem da vida? Será que elas pensam nisso ou somente vão levando a vida? Ou deixando a vida os levarem?
Será que quanto mais quantia temos, mais felizes somos? Os estudos mais longos de Harvard indicam que não. A felicidade está mais ligada ao convívio humano e ao conforto social do que ao quantia em si — e, certamente, menos ainda à quantidade dele.
Por outro lado, existe um pensamento quase automático: “se não dá quantia, é perda de tempo”. Se ninguém paga por um pouco, portanto não valenada? A lógica faz sentido do ponto de vista de mercado. O quantia é, sim, uma maneira objetiva de atribuir valor às coisas. Mas será que é a única?
Não me parece. Mas a partir do momento em que abrimos esse leque, entram em cena outras métricas: realização pessoal, impacto, construção de reputação, imposto social, prazer, ego, aprovação… E aí a coisa se complica.
Posso estar fazendo um pouco que não me traz retorno financeiro direto, mas que me conecta com pessoas, estimula boas conversas, amplia minha rede. Levante item, por exemplo, pode ser um caso disso. Estou escrevendo, não porque vai me render um pouco financeiramente, mas porque ortografar me ajuda a acessar outras pessoas, encontrar outras perspectivas e sedimentar alguns pontos importantes nessa trajetória.
Ainda assim, fico com a pulga detrás da ouvido: será que tudo isso não volta ao quantia, mesmo que indiretamente? Ou seja, será que eu não faço essas conexões na esperança de que, lá na frente, elas gerem um pouco que possa ser monetizado?
Temos prazer em fazer um pouco que beneficie os outros sem que isso gere retorno financeiro? Talvez devêssemos. Mas será que conseguimos? E quem consegue — por quanto tempo aguenta?
Sempre admirei professores. São, na maioria das vezes, pessoas que escolheram um caminho com outras métricas de valor. Fala-se muito que ser professor é quase fazer um “voto de pobreza”. E é verdade que ganham pouco, têm vidas apertadas e entrada restringido ao conforto que o quantia proporciona.
Mas será que são mais felizes do que aquele colega que largou tudo, empreendeu e hoje tem patrimônio, viagens e liberdade? É difícil expressar. Porque não estamos falando só de quantia. Estamos falando de sentido. De satisfação. De propósito.
Eu mesmo enfrento esse dilema com frequência. Tenho dificuldade em manter por muito tempo projetos que não têm viabilidade financeira clara. Palato de ver o esforço sendo valorizado — e o quantia costuma ser o principal indicativo disso. Se ninguém paga por um pouco, eu tendo a concluir que não tem valor. E não falo cá de falta de entrada ou poder aquisitivo. Falo de percepção mesmo: a de que “isso não vale”.
E, ao mesmo tempo, sou usuário quotidiano de teor gratuito. Acompanho influenciadores, sites, artigos, entrevistas… e não pago zero por isso. Talvez não pagaria nem se me pedissem.
Porquê escrevi em outro texto, num mundo de riqueza, o que tem valor é a comunidade — não o teor em si. Mas aí surge a grande pergunta: porquê tomar esse valor se não for pelo quantia? Existe outra forma de mensurar isso?
Encaminhando para o termo, vejo que essa reflexão é menos sobre o quantia em si e mais sobre nossa relação com ele. É sobre porquê dar valor às coisas que fazemos quando o retorno financeiro não está presente. Somos capazes de fazer isso? Talvez essa dificuldade minha venha do modo porquê fui criado, ou talvez da mentalidade pragmática que desenvolvi no universo do trading, apostas, cripto.
Ou pode ser só a forma matemática pela qual eu vejo o mundo. Difícil concluir. Mas, ainda assim, sinto que ortografar isso me ajudou a organizar melhor a questão.
E te pergunto: o que você faz — ou deixa de fazer — só porque não tem um preço atrelado? Será mesmo que o valor das coisas precisa sempre passar pelo quantia?
Gustavo Cunha é fundador da Fintrender.com
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